quarta-feira, 26 de setembro de 2007

Crônica de uma morte anunciada

O título do livro de Gabriel Garcia Márquez, Crônica de uma morte anunciada, bem poderia ser aplicada a tudo o que nos últimos tempos tem ocorrido no Senado.

No romance de Garcia Márquez, o destino trágico do jovem Santiago Nasar é anunciado logo na primeira linha do texto. Ângela Vicario o acusa de tê-la desonrado e seus irmãos gêmeos matam Santiago a facadas. Apesar de conhecido o desejo de vingança, nada pôde salvar Santiago.

Em todo o episódio envolvendo o Senador Renan Calheiros, Presidente do Senado, há também a crônica de uma morte anunciada.

Desde que eclodiram as denúncias, o Planalto e o PT foram deixando clara sua intenção de defender o aliado, arrastando o ambiente de degradação política, fazendo a crise do Presidente do Senado contaminar a própria instituição.

Tal disposição chegou ao seu clímax na sessão secreta que absolveu Calheiros. Ideli Salvati, do PT, fez um discurso veemente em defesa de Renan; e Aloísio Mercadante trabalhou afincadamente para obter votos (ou abstenções) que permitissem a absolvição daquele.

Absolvido Renan Calheiros, uma justa indignação se levantou na sociedade contra a impunidade descarada, contra a corrupção política, contra a máxima "os fins justificam os meios". Curiosamente, aproveitando tal onda de indignação, o PT (o grande artífice do procedimento escandaloso) veio, ele mesmo, propor o fim do Senado... a bem da democracia!

O PT desonrou o Senado para depois pedir sua morte! Crônica de uma morte anunciada.

Sem o Senado, o sistema de "rolo compressor" sobre o Congresso, para torná-lo uma mera força auxiliar do Executivo petista, sem qualquer expressão, se tornaria mais ágil. Para isso é preciso acabar com ele. E para acabar com ele é necessário a convocação de uma assembléia constituinte exclusiva para a reforma política. A fórmula chavista, também empregue na Bolívia e no Equador para instaurar regimes populistas autoritários.

Quem dá o script desta morte anunciada é o próprio PT, pela pena de Rui Falcão, deputado estadual (SP), e ex-presidente do PT. O título de seu artigo na Folha de S. Paulo (20.set.2007) diz tudo: Pela democracia, o Senado deve acabar. Evocando o "episódio repulsivo" da absolvição (perpetrado pelo próprio PT!), Rui Falcão acha que o mesmo pode ajudar na solução da crise de representação:

  • "A absolvição do senador Renan Calheiros pode contribuir, paradoxalmente, para aperfeiçoar a democracia se a reflexão sobre o escândalo transpuser as considerações de caráter circunstancial. O episódio repulsivo oferece a oportunidade de avançar no diagnóstico e na solução da crise da representação. Uma crise que se manifesta no fosso crescente entre a vontade dos representantes e a dos representados ....

    Mas o que mais importa é constatar que a existência do Senado Federal é um desserviço à democracia brasileira. Não apenas por esses episódios de denúncia de corrupção mas também pela fraude ao pacto federativo, ao sistema representativo, pelo seu poder revisor ante a Câmara dos Deputados e - a partir de 1988 - ampliado com a faculdade de propor leis.

    Como instituição, o Senado foi introduzido no Brasil à época do império e ainda hoje traz consigo vestígios do mando monárquico e cacoetes oligárquicos das velhas repúblicas. ....

    É chegada a hora de discutir o fim do sistema bicameral do país, eliminando o Senado e definindo um modelo de representação unicameral adequado e igualitário, que assegure a diversidade e a expressão federativas.

    Não é de esperar que tal distorção, geradora de privilégios antidemocráticos, seja corrigida por iniciativa de seus beneficiários diretos - os parlamentares, em especial os senadores. Daí a necessidade da convocação de uma assembléia constituinte exclusiva para a reforma política, que se oriente pela necessidade de prover de substância democrática as instâncias de representação".

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2 comentários:

Anônimo disse...

ZEPOVO
O fim dos tempos anunciado por suas trombetas só será possivel se a "oposição" ao PT continuar light. Realmente o noviciado dos tucanos na oposição me diverte. Isto é perigoso, mas fazer o que? Cabe ao PT aproveitar.
Renan foi absolvido não só pelo PT, que inclusive foi até sutil e soube manobrar no Senado.

Anônimo disse...

ZEPOVO
O trato com Renan era ele se licenciar após ser absolvido, mais tarde ele renunciaria discretamente para tratar de assuntos de saude ou familia.Mas trato com Renan vale o que??