Dois atos simbólicos: um só legado
Nesta quadra festiva, que se encerrou com o dia de Reis, muitos se deixam envolver pelo clima de euforia, descontração e até de imprevidência, que normalmente cerca as comemorações da chegada de um novo Ano.
Quando os fogos desenham na noite suas figuras multicoloridas e deslumbrantes, quando as champagnes estouram a anunciar a meia-noite, que nos faz transpor o umbral de um ano novo, somos tentados a esquecer as apreensões que nos cercam e a encarar o futuro com otimismo, por vezes um tanto inconseqüente.
Passados estes momentos, frenéticos mas fugazes, o novo ano salta diante de nós com uma realidade que está longe de ser apenas risonha, em parte herdada do ano que finda. E não me parece salutar ignorar essa realidade, ainda que desagradável.
Gesto simbólico de despedida
Volto-me neste post do Radar da Midia para a análise do derradeiro ato político do ex-presidente Lula e de um gesto simbólico que marcou a posse de Dilma Rousseff, buscando traçar entre eles um elo que me parece inequívoco.
Lula da Silva decidiu marcar sua despedida de oitos anos na Presidência da República com uma medida político-institucional, de forte alcance para o Brasil, tanto no plano interno como no externo, e que considero simbólica: negar a extradição do terrorista italiano, Cesare Battisti (foto - reprodução).
Com este ato simbólico, Lula pretendeu consignar para a História o real significado ideológico de seus dois mandatos de Presidente da República. Deixou-o para o último dia de seu segundo mandato, como alguém que posta uma assinatura ao final de um texto, de forma a chancelá-lo com sua marca inconfundível; mas igualmente para que o governo de sua sucessora, Dilma Rousseff, se iniciasse sob o impacto de tal gesto! Agiu, assim, como o corredor olímpico que passa o facho ao que continuará a corrida, transmitindo-lhe seu legado.
O caso Cesare Battisti
Um histórico, ainda que sumário, do caso Cesare Battisti ajudará a melhor explicitar o significado do gesto e do legado de Lula.
Battisti, de 56 anos, foi condenado à prisão perpétua pela justiça italiana em 1993, acusado de quatro assassinatos cometidos na década de 70, enquanto militava no grupo de extrema-esquerda Proletários Armados pelo Comunismo (PAC), do qual era expoente.
Foragido da Itália, após viver na França e para evitar sua extradição confirmada por Corte daquele país, Battisti viajou para o Brasil, em 2004, quando os “companheiros” do lulo-petismo já tinham sido alçados ao poder.
Entretanto, em cumprimento de mandado da Interpol, Battisti foi preso no Brasil, em 2007. A defesa do italiano alegou que as condenações pelos assassinatos cometidos decorriam de “perseguição política” do Estado italiano e, baseado nessa alegação, o então Ministro da Justiça, Tarso Genro, em janeiro de 2009, concedeu refúgio político a Battisti. O mesmo Tarso Genro que deportara para Cuba, atribiliariamente, os atletas cubanos que tinham pedido refúgio para escapar da ditadura comunista de Fidel Castro.
Ante a onda de protestos gerada pelo refúgio concedido ao terrorista-assassino, Lula logo saiu em defesa do Ministro do PT e de sua decisão.
Lula afronta o STF
Em novembro de 2009, o Supremo Tribunal Federal (STF) anulou o refúgio concedido por Tarso Genro, por considerar não existirem elementos para atribuir a Battisti a condição de refugiado político; descartou como infundada a alegação de condenação injusta, e determinou sua extradição.
Os moderados e otimistas de plantão logo se prontificaram a espalhar que Lula, com seu pragmatismo, seu sentido de estadista e respeito pelas instituições, seguiria a determinação do STF e extraditaria Battisti, sem olhar a razões ideológicas.
Mas o ex-presidente encarregou-se de desmentir a versão.
Baseado em questionável parecer da Advocacia Geral da União (AGU), em 31 de dezembro de 2010, derradeiro dia de seu mandato, Lula afrontou o STF, ao acolher as alegações, já rechaçadas por aquela Corte, de que Battisti poderia ser “submetido a atos de perseguição e discriminação” na Itália em razão de sua “opinião política: “O governo brasileiro age na suposição de que o terrorista, condenado por quatro assassinatos em seu país, em julgamentos fundados na lei e com direito a plena defesa e em três instâncias diferentes, fosse ser vítima de perseguição política, como se a Itália fosse uma Coreia do Norte, um Irã, uma Venezuela”, escreve Ricardo Setti em sua coluna (Veja, 01.01.2011).
Erro jurídico clamoroso
De acordo com Francisco Rezek, antigo ministro do STF, antigo juiz da Corte de Haia e ainda ex-chanceler, Lula incorreu num “erro jurídico clamoroso” ao descumprir um acordo internacional: “Ainda que não houvesse tratado [de extradição], o presidente ir contra a decisão do STF seria uma ruptura com nossa tradição diplomática. Mas quando há tratado é uma afronta ao princípio mais básico de direito internacional”.
Para Rezek, a alegação da AGU de que Lula teria a última palavra não é sustentável, pois a palavra final só cabe ao Presidente quando não há um acordo de extradição com o país de origem (cfr. Conceder refúgio a Battisti é ato ilícito, avalia especialista, Veja on line, 01.01.2011).
“Decisão ideológica e irresponsável”
Para o senador Álvaro Dias, vice líder do PSDB no Senado, o presidente passou por cima das Justiças italiana e brasileira, desconsiderando a posição do STF e dos tribunais italianos e colocou em risco as relações diplomáticas com um país amigo: “A Itália decidiu, condenou e o Lula, que não tem o conhecimento do poder judiciário, resolveu absolver. Isso é uma afronta à diplomacia, desrespeitando um dos poderes judiciários mais conceituados do mundo”.
Por sua vez, o presidente do PSDB, senador Sérgio Guerra, acredita que Lula violou os preceitos que regem a diplomacia: “Essa decisão não ajuda nosso país nem a democracia, é mais uma atitude do ambiente de megalomania e desequilíbrio desse governo, que é pautado por exageros equivocados como o da relação que teve com o Irã”.
Já o líder do DEM no Senado, José Agripino Maia, afirmou que a decisão de Lula foi “política, pessoal, ideológica e irresponsável” (cfr. Veja on line, Oposição considera decisão de Lula de não extraditar Battisti uma afronta à diplomacia, 31.12.2010).
Itália reage
A decisão de Lula, anunciada por seu Ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, foi considerada “inaceitável” pelas autoridades italianas.
O ministro italiano da Defesa, Ignazio La Russa, disse que “se realizou a pior previsão”. Por seu turno o Ministro das Relações Exteriores da Itália, Franco Frattini declarou que Lula terminou da “pior maneira” o seu mandato; e aproveitou para relembrar que Battisti publicou um livro no qual reivindicou e explicou as razões dos homicídios que perpetrou.
Fraude e desonestidade
De imediato a tropa de choque lulo-petista invadiu blogs, redes sociais e fóruns de discussão, para repetir, sem cessar, que as reações oficiais denotavam a indignação do governo “fascista” da Itália (em alusão ao governo de centro-direita de Berlusconi) perante a atitude “soberana” de Lula.
Uma vez mais, a estratégia da fraude e da desonestidade se patenteou. De fato, esse impropério rancoroso é destituído de qualquer fundamento.
Foi a Corte Europeia de Direitos Humanos quem rejeitou os argumentos da defesa de Battisti e chancelou as decisões da Justiça francesa e italiana de que Battisti devia ser extraditado.
Foi o Presidente da Itália, Giorgio Napolitano (qualificado em tempos por Lula como “companheiro” Napolitano) um comunista histórico, aliado de Berlinguer na fórmula do eurocomunismo, quem, de modo mais veemente, se insurgiu contra a atitude cúmplice do ex-presidente brasileiro.
Foram partidos políticos de centro, esquerda e direita, junto a agremiações de estudantes, que realizaram mobilizações em frente à Embaixada do Brasil em Roma e aos consulados brasileiros em outras cidades, como Milão e Nápoles, durante as quais deixaram claro que seu protesto não se voltava contra o Brasil, mas contra Lula da Silva a quem alguns chamavam de “covarde”.
Foi a União Europeia quem passou a articular uma reação diplomática de apoio à Itália, na tentativa de ampliar a pressão sobre o Brasil para que reverta a decisão de não extraditar Cesare Battisti.
Foi o jornal La Repubblica, próximo a ambientes de esquerda, e um dos órgãos de imprensa estrangeira que mais apologia fez de Lula nos últimos anos, quem comentou: “No país do samba, há uma espécie de cumplicidade ideal com todos os Battisti do mundo, com os terroristas, com os justiceiros. Lula deve ter pensado que a Itália é uma republiqueta como a sua. (Ele) acredita que o mundo inteiro é formado por paisecos no limite entre o populismo e a ditadura militar”.
Familiares das vítimas de Battisti insurgem-se
Ignazio La Russa, ministro italiano da Defesa ressaltou que a decisão de Lula da Silva “além de ser injusta e gravemente ofensiva para a Itália, o é sobretudo para a memória das pessoas assassinadas e para a dor dos familiares de todos aqueles que perderam a vida por responsabilidade do assassino Battisti" (cfr. Folha.com 31.12.2010).
Alberto Torregiani foi um desses familiares que se mostrou inconformado com a atitude de Lula. Tinha apenas quinze anos quando seu anseio de se tornar jogador de futebol se desfez. Integrantes do grupo Proletários Armados pelo Comunismo (PAC) invadiram a joalheria da família em Milão e, sem dizerem uma palavra, fuzilaram seu pai e o deixaram paraplégico.
Em entrevista ao site de Veja, Torregiani invectivou: “Lula gosta de dizer que lutou pela democracia do Brasil e que essa era sua finalidade. É de se esperar que uma pessoa que diga isso tenha humanidade e respeito pela civilidade, o que não aconteceu. Eu sou a prova viva de que Battisti é um assassino".
De inconformidade foi também a reação de Maurizio Campagna, irmão do policial Andrea Campagna, assassinado por Cesare Battisti, em abril de 1979: “A França ia extraditá-lo. A Corte Europeia afirmou que não existiam condições para não devolvê-lo à Itália. O Supremo Tribunal Federal do Brasil determinou a extradição. Esta decisão final foi uma vergonha” (cfr. Para irmão de vítima, manter Battisti no Brasil é “uma vergonha”, Folha.com, 4.01.2011).
Legitimação de crimes terroristas
De tudo o que até agora foi considerado, não é difícil depreender que só um compromisso ideológico pode explicar a escandalosa atitude de Lula em relação ao terrorista-assassino, Cesare Battisti.
“Embora cercado de pareceres técnicos e rapapés jurídicos, o presidente tomou sua decisão levando em conta somente compromissos políticos e ideológicos com a militância de esquerda que vê em Battisti um “herói”, ignorando olimpicamente as legítimas demandas italianas”, escreveu Marcos Guterman (Estadao.com.br, Battisti já pode voltar ao calçadão de Copacabana, 31.12.2010).
Ao dar guarida a Battisti, sob a alegação de que o julgamento do terrorista e a pena respectiva podem conformar uma “perseguição” política, Lula deu uma vigorosa chancela de liceidade ao terrorismo e aos crimes praticados em nome do mesmo, enquanto negou legitimidade ao ato punitivo de um Estado de Direito. O que de si constitui a profissão ideológica da ilegitimidade do Estado de Direito democrático (a que os marxistas apodam de Estado burguês) e da legitimidade das forças revolucionárias que a ele se opõem. O ato de Lula é, pois, tudo menos ingênuo ou filantrópico.
Cabe ressaltar ainda que o grupo Proletários Armados pelo Comunismo, de Cesare Battisti, nem sequer tinha o pretexto de lutar contra uma ditadura, pois suas ações foram praticadas no âmbito de um regime democrático.
Data escolhida
Também a data em que Lula decidiu anunciar sua decisão de não extraditar Battisti parece calculada.
Não o fez antes das eleições, pois seria altamente prejudicial a sua candidata Dilma Rousseff. Esta, aliás, declarou durante quase toda a campanha eleitoral ser favorável à extradição de Battisti e à decisão do STF. Mais um dos engodos com que Dilma ludibriou o eleitorado, já que agora seus ministros defendem com unhas e dentes a decisão do ex-presidente Lula.
Mas Lula poderia ter negado a extradição pouco tempo após a vitória de Dilma no segundo turno, evitando deste modo que esse ato contaminasse o início do governo de sua sucessora. Entretanto, Lula deixou tal ato para o último dia de seu mandato de forma a marcar o início do governo de sua sucessora e deixar claro que esse legado se prolonga pelo mandato que agora se inicia.
Parece evidente que este calendário foi minuciosamente calculado pelas duas equipes, na transição, uma vez que esta se fez em “casa” (entre petistas).
Lula firma seu legado ideológico
O que Lula quis deixar bem assentado – na linha de outras atitudes assumidas anteriormente – foi seu comprometimento ideológico com a esquerda e até com a esquerda radical.
Lula se encarregou de rasgar diante do mundo a fantasia que tantos se esforçaram em repetir e reproduzir, do homem simples, do operário humilde e ingênuo, amigo dos pobres, cuja singeleza alcançou invejável sucesso, por seu espírito conciliador, moderado, pragmático e avesso a ideologias.
Deixou claro que foi e continua a ser o líder sindical, nascido no berço da “esquerda católica”, inspirada pela Teologia da Libertação, adulador da ditadura comuno-castrista que subsiste em Cuba, e que se mantém como um referencial no sossobro da esquerda mundial, essa mesma ditadura cubana que inspirou por todo o mundo movimentos terroristas marxistas.
Afinal qual o sentido do Foro de São Paulo, criado sob sua inspiração e a de Fidel Castro, quando da queda do Muro de Berlim? A implantação de um projeto socialo-comunista na América do Sul, que compensasse certa esquerda internacional pelas irreparáveis perdas da ruína do mundo comunista por detrás da Cortina de Ferro.
Exaltação do passado terrorista
A esse gesto de despedida de Lula, que se torna também o primeiro ato de repercussão internacional do governo Dilma, se soma um outro gesto, igualmente simbólico, que marcou a tomada de posse da nova Presidente.
“Rousseff honrará seu passado guerrilheiro na sua posse”, afirmava às vésperas da cerimônia o conhecido jornal espanhol El Pais (31.12.2010).
Na posse, como 40º Presidente da República, Dilma Rousseff fez questão de dar lugar de honra a onze amigas, militantes de extrema-esquerda que, inclusive pelas armas, tentaram implantar no Brasil um regime ditatorial de cunho comunista e que com ela partilharam as vicissitudes da prisão.
“Muitas delas – destaca ainda o El Pais - não se conheciam quando foram presas e nem todas militavam nos mesmos grupos da extrema esquerda que se dividiam entre as que defendiam a luta armada contra os militares - como a nova presidente Rousseff - e as que preferiam lutar contra os militares de outras formas. Na prisão se tornaram todas amigas e agora se reunem como em um sonho: `Nunca imaginei que alguém da luta armada pudesse um dia ser presidente da República´, afirma Rita Sipahi que atuava na Ação Popular, uma advogada que preside hoje a Comissão de Amnistia do Ministério da Justiça” (El Pais, 31.12.2010).
Antes das eleições tive oportunidade de assinalar aqui que Dilma Rousseff tudo fez para que não se aprofundasse seu passado na luta armada; e que, tanto ela quanto o PT, não haviam dado provas de seu abandono efetivo das ideologias e práticas que levaram grupos de esquerda a enveredar pela luta armada. Dilma jamais se arrependeu publicamente de sua participação nesse tipo de ativismo político.
Ao fazer o convite a suas companheiras de luta desvaneceu as dúvidas que pudessem subsistir, pois exaltou o princípio do terrorismo como meio legítimo para alcançar o poder. A Presidente apenas afirma que o País mudou, acentuando desse modo que as circunstâncias são outras e não justificam, por agora, o uso de métodos de luta que incluam as ações terroristas. Mas a questão é estratégica e não de princípios.
Um legado alarmante
Os dois atos simbólicos, de Lula e de Dilma, meticulosamente planejados no tempo, se somam e pretendem ser reveladores do sentido mais íntimo do projeto de poder lulo-petista. O lulo-petismo – ontem com Lula na Presidência, hoje com Dilma – não renunciou à ideologia de esquerda que inspirou a luta armada, nem renunciou às metas e aos métodos da esquerda, inclusive terrorista. Ao proteger e homenagear os protagonistas da luta armada, afirma que esse passado deve ser exaltado (embora, por conveniências, possa não ser seguido).
O lulo-petismo não acredita no sistema de Democracia representativa. Apenas se serve desse regime e de suas liberdades para alcançar o poder e destruir a própria democracia.
Coincidência: esses dois atos simbólicos se dão precisamente quando o terrorismo de esquerda volta a ressurgir na Europa, e mais concretamente na Grécia e na Itália, com os recentes atentados à bomba a diversas embaixadas.
Outra coincidência: esses dois atos se dão quando o regime de Hugo Chávez vem transformando o território venezuelano em refúgio seguro e campo de treinamento de grupos terroristas como as FARC da Colômbia, a ETA da Espanha, o Hezbollah do Líbano (financiado pelo regime iraniano), o IRA da Irlanda, etc. O mesmo Hugo Chávez que não escondeu seu apoio a Dilma Rousseff.
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Quando os fogos desenham na noite suas figuras multicoloridas e deslumbrantes, quando as champagnes estouram a anunciar a meia-noite, que nos faz transpor o umbral de um ano novo, somos tentados a esquecer as apreensões que nos cercam e a encarar o futuro com otimismo, por vezes um tanto inconseqüente.
Passados estes momentos, frenéticos mas fugazes, o novo ano salta diante de nós com uma realidade que está longe de ser apenas risonha, em parte herdada do ano que finda. E não me parece salutar ignorar essa realidade, ainda que desagradável.
Gesto simbólico de despedida
Volto-me neste post do Radar da Midia para a análise do derradeiro ato político do ex-presidente Lula e de um gesto simbólico que marcou a posse de Dilma Rousseff, buscando traçar entre eles um elo que me parece inequívoco.
Lula da Silva decidiu marcar sua despedida de oitos anos na Presidência da República com uma medida político-institucional, de forte alcance para o Brasil, tanto no plano interno como no externo, e que considero simbólica: negar a extradição do terrorista italiano, Cesare Battisti (foto - reprodução).
Com este ato simbólico, Lula pretendeu consignar para a História o real significado ideológico de seus dois mandatos de Presidente da República. Deixou-o para o último dia de seu segundo mandato, como alguém que posta uma assinatura ao final de um texto, de forma a chancelá-lo com sua marca inconfundível; mas igualmente para que o governo de sua sucessora, Dilma Rousseff, se iniciasse sob o impacto de tal gesto! Agiu, assim, como o corredor olímpico que passa o facho ao que continuará a corrida, transmitindo-lhe seu legado.
O caso Cesare Battisti
Um histórico, ainda que sumário, do caso Cesare Battisti ajudará a melhor explicitar o significado do gesto e do legado de Lula.
Battisti, de 56 anos, foi condenado à prisão perpétua pela justiça italiana em 1993, acusado de quatro assassinatos cometidos na década de 70, enquanto militava no grupo de extrema-esquerda Proletários Armados pelo Comunismo (PAC), do qual era expoente.
Foragido da Itália, após viver na França e para evitar sua extradição confirmada por Corte daquele país, Battisti viajou para o Brasil, em 2004, quando os “companheiros” do lulo-petismo já tinham sido alçados ao poder.
Entretanto, em cumprimento de mandado da Interpol, Battisti foi preso no Brasil, em 2007. A defesa do italiano alegou que as condenações pelos assassinatos cometidos decorriam de “perseguição política” do Estado italiano e, baseado nessa alegação, o então Ministro da Justiça, Tarso Genro, em janeiro de 2009, concedeu refúgio político a Battisti. O mesmo Tarso Genro que deportara para Cuba, atribiliariamente, os atletas cubanos que tinham pedido refúgio para escapar da ditadura comunista de Fidel Castro.
Ante a onda de protestos gerada pelo refúgio concedido ao terrorista-assassino, Lula logo saiu em defesa do Ministro do PT e de sua decisão.
Lula afronta o STF
Em novembro de 2009, o Supremo Tribunal Federal (STF) anulou o refúgio concedido por Tarso Genro, por considerar não existirem elementos para atribuir a Battisti a condição de refugiado político; descartou como infundada a alegação de condenação injusta, e determinou sua extradição.
Os moderados e otimistas de plantão logo se prontificaram a espalhar que Lula, com seu pragmatismo, seu sentido de estadista e respeito pelas instituições, seguiria a determinação do STF e extraditaria Battisti, sem olhar a razões ideológicas.
Mas o ex-presidente encarregou-se de desmentir a versão.
Baseado em questionável parecer da Advocacia Geral da União (AGU), em 31 de dezembro de 2010, derradeiro dia de seu mandato, Lula afrontou o STF, ao acolher as alegações, já rechaçadas por aquela Corte, de que Battisti poderia ser “submetido a atos de perseguição e discriminação” na Itália em razão de sua “opinião política: “O governo brasileiro age na suposição de que o terrorista, condenado por quatro assassinatos em seu país, em julgamentos fundados na lei e com direito a plena defesa e em três instâncias diferentes, fosse ser vítima de perseguição política, como se a Itália fosse uma Coreia do Norte, um Irã, uma Venezuela”, escreve Ricardo Setti em sua coluna (Veja, 01.01.2011).
Erro jurídico clamoroso
De acordo com Francisco Rezek, antigo ministro do STF, antigo juiz da Corte de Haia e ainda ex-chanceler, Lula incorreu num “erro jurídico clamoroso” ao descumprir um acordo internacional: “Ainda que não houvesse tratado [de extradição], o presidente ir contra a decisão do STF seria uma ruptura com nossa tradição diplomática. Mas quando há tratado é uma afronta ao princípio mais básico de direito internacional”.
Para Rezek, a alegação da AGU de que Lula teria a última palavra não é sustentável, pois a palavra final só cabe ao Presidente quando não há um acordo de extradição com o país de origem (cfr. Conceder refúgio a Battisti é ato ilícito, avalia especialista, Veja on line, 01.01.2011).
“Decisão ideológica e irresponsável”
Para o senador Álvaro Dias, vice líder do PSDB no Senado, o presidente passou por cima das Justiças italiana e brasileira, desconsiderando a posição do STF e dos tribunais italianos e colocou em risco as relações diplomáticas com um país amigo: “A Itália decidiu, condenou e o Lula, que não tem o conhecimento do poder judiciário, resolveu absolver. Isso é uma afronta à diplomacia, desrespeitando um dos poderes judiciários mais conceituados do mundo”.
Por sua vez, o presidente do PSDB, senador Sérgio Guerra, acredita que Lula violou os preceitos que regem a diplomacia: “Essa decisão não ajuda nosso país nem a democracia, é mais uma atitude do ambiente de megalomania e desequilíbrio desse governo, que é pautado por exageros equivocados como o da relação que teve com o Irã”.
Já o líder do DEM no Senado, José Agripino Maia, afirmou que a decisão de Lula foi “política, pessoal, ideológica e irresponsável” (cfr. Veja on line, Oposição considera decisão de Lula de não extraditar Battisti uma afronta à diplomacia, 31.12.2010).
Itália reage
A decisão de Lula, anunciada por seu Ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, foi considerada “inaceitável” pelas autoridades italianas.
O ministro italiano da Defesa, Ignazio La Russa, disse que “se realizou a pior previsão”. Por seu turno o Ministro das Relações Exteriores da Itália, Franco Frattini declarou que Lula terminou da “pior maneira” o seu mandato; e aproveitou para relembrar que Battisti publicou um livro no qual reivindicou e explicou as razões dos homicídios que perpetrou.
Fraude e desonestidade
De imediato a tropa de choque lulo-petista invadiu blogs, redes sociais e fóruns de discussão, para repetir, sem cessar, que as reações oficiais denotavam a indignação do governo “fascista” da Itália (em alusão ao governo de centro-direita de Berlusconi) perante a atitude “soberana” de Lula.
Uma vez mais, a estratégia da fraude e da desonestidade se patenteou. De fato, esse impropério rancoroso é destituído de qualquer fundamento.
Foi a Corte Europeia de Direitos Humanos quem rejeitou os argumentos da defesa de Battisti e chancelou as decisões da Justiça francesa e italiana de que Battisti devia ser extraditado.
Foi o Presidente da Itália, Giorgio Napolitano (qualificado em tempos por Lula como “companheiro” Napolitano) um comunista histórico, aliado de Berlinguer na fórmula do eurocomunismo, quem, de modo mais veemente, se insurgiu contra a atitude cúmplice do ex-presidente brasileiro.
Foram partidos políticos de centro, esquerda e direita, junto a agremiações de estudantes, que realizaram mobilizações em frente à Embaixada do Brasil em Roma e aos consulados brasileiros em outras cidades, como Milão e Nápoles, durante as quais deixaram claro que seu protesto não se voltava contra o Brasil, mas contra Lula da Silva a quem alguns chamavam de “covarde”.
Foi a União Europeia quem passou a articular uma reação diplomática de apoio à Itália, na tentativa de ampliar a pressão sobre o Brasil para que reverta a decisão de não extraditar Cesare Battisti.
Foi o jornal La Repubblica, próximo a ambientes de esquerda, e um dos órgãos de imprensa estrangeira que mais apologia fez de Lula nos últimos anos, quem comentou: “No país do samba, há uma espécie de cumplicidade ideal com todos os Battisti do mundo, com os terroristas, com os justiceiros. Lula deve ter pensado que a Itália é uma republiqueta como a sua. (Ele) acredita que o mundo inteiro é formado por paisecos no limite entre o populismo e a ditadura militar”.
Familiares das vítimas de Battisti insurgem-se
Ignazio La Russa, ministro italiano da Defesa ressaltou que a decisão de Lula da Silva “além de ser injusta e gravemente ofensiva para a Itália, o é sobretudo para a memória das pessoas assassinadas e para a dor dos familiares de todos aqueles que perderam a vida por responsabilidade do assassino Battisti" (cfr. Folha.com 31.12.2010).
Alberto Torregiani foi um desses familiares que se mostrou inconformado com a atitude de Lula. Tinha apenas quinze anos quando seu anseio de se tornar jogador de futebol se desfez. Integrantes do grupo Proletários Armados pelo Comunismo (PAC) invadiram a joalheria da família em Milão e, sem dizerem uma palavra, fuzilaram seu pai e o deixaram paraplégico.
Em entrevista ao site de Veja, Torregiani invectivou: “Lula gosta de dizer que lutou pela democracia do Brasil e que essa era sua finalidade. É de se esperar que uma pessoa que diga isso tenha humanidade e respeito pela civilidade, o que não aconteceu. Eu sou a prova viva de que Battisti é um assassino".
De inconformidade foi também a reação de Maurizio Campagna, irmão do policial Andrea Campagna, assassinado por Cesare Battisti, em abril de 1979: “A França ia extraditá-lo. A Corte Europeia afirmou que não existiam condições para não devolvê-lo à Itália. O Supremo Tribunal Federal do Brasil determinou a extradição. Esta decisão final foi uma vergonha” (cfr. Para irmão de vítima, manter Battisti no Brasil é “uma vergonha”, Folha.com, 4.01.2011).
Legitimação de crimes terroristas
De tudo o que até agora foi considerado, não é difícil depreender que só um compromisso ideológico pode explicar a escandalosa atitude de Lula em relação ao terrorista-assassino, Cesare Battisti.
“Embora cercado de pareceres técnicos e rapapés jurídicos, o presidente tomou sua decisão levando em conta somente compromissos políticos e ideológicos com a militância de esquerda que vê em Battisti um “herói”, ignorando olimpicamente as legítimas demandas italianas”, escreveu Marcos Guterman (Estadao.com.br, Battisti já pode voltar ao calçadão de Copacabana, 31.12.2010).
Ao dar guarida a Battisti, sob a alegação de que o julgamento do terrorista e a pena respectiva podem conformar uma “perseguição” política, Lula deu uma vigorosa chancela de liceidade ao terrorismo e aos crimes praticados em nome do mesmo, enquanto negou legitimidade ao ato punitivo de um Estado de Direito. O que de si constitui a profissão ideológica da ilegitimidade do Estado de Direito democrático (a que os marxistas apodam de Estado burguês) e da legitimidade das forças revolucionárias que a ele se opõem. O ato de Lula é, pois, tudo menos ingênuo ou filantrópico.
Cabe ressaltar ainda que o grupo Proletários Armados pelo Comunismo, de Cesare Battisti, nem sequer tinha o pretexto de lutar contra uma ditadura, pois suas ações foram praticadas no âmbito de um regime democrático.
Data escolhida
Também a data em que Lula decidiu anunciar sua decisão de não extraditar Battisti parece calculada.
Não o fez antes das eleições, pois seria altamente prejudicial a sua candidata Dilma Rousseff. Esta, aliás, declarou durante quase toda a campanha eleitoral ser favorável à extradição de Battisti e à decisão do STF. Mais um dos engodos com que Dilma ludibriou o eleitorado, já que agora seus ministros defendem com unhas e dentes a decisão do ex-presidente Lula.
Mas Lula poderia ter negado a extradição pouco tempo após a vitória de Dilma no segundo turno, evitando deste modo que esse ato contaminasse o início do governo de sua sucessora. Entretanto, Lula deixou tal ato para o último dia de seu mandato de forma a marcar o início do governo de sua sucessora e deixar claro que esse legado se prolonga pelo mandato que agora se inicia.
Parece evidente que este calendário foi minuciosamente calculado pelas duas equipes, na transição, uma vez que esta se fez em “casa” (entre petistas).
Lula firma seu legado ideológico
O que Lula quis deixar bem assentado – na linha de outras atitudes assumidas anteriormente – foi seu comprometimento ideológico com a esquerda e até com a esquerda radical.
Lula se encarregou de rasgar diante do mundo a fantasia que tantos se esforçaram em repetir e reproduzir, do homem simples, do operário humilde e ingênuo, amigo dos pobres, cuja singeleza alcançou invejável sucesso, por seu espírito conciliador, moderado, pragmático e avesso a ideologias.
Deixou claro que foi e continua a ser o líder sindical, nascido no berço da “esquerda católica”, inspirada pela Teologia da Libertação, adulador da ditadura comuno-castrista que subsiste em Cuba, e que se mantém como um referencial no sossobro da esquerda mundial, essa mesma ditadura cubana que inspirou por todo o mundo movimentos terroristas marxistas.
Afinal qual o sentido do Foro de São Paulo, criado sob sua inspiração e a de Fidel Castro, quando da queda do Muro de Berlim? A implantação de um projeto socialo-comunista na América do Sul, que compensasse certa esquerda internacional pelas irreparáveis perdas da ruína do mundo comunista por detrás da Cortina de Ferro.
Exaltação do passado terrorista
A esse gesto de despedida de Lula, que se torna também o primeiro ato de repercussão internacional do governo Dilma, se soma um outro gesto, igualmente simbólico, que marcou a tomada de posse da nova Presidente.
“Rousseff honrará seu passado guerrilheiro na sua posse”, afirmava às vésperas da cerimônia o conhecido jornal espanhol El Pais (31.12.2010).
Na posse, como 40º Presidente da República, Dilma Rousseff fez questão de dar lugar de honra a onze amigas, militantes de extrema-esquerda que, inclusive pelas armas, tentaram implantar no Brasil um regime ditatorial de cunho comunista e que com ela partilharam as vicissitudes da prisão.
“Muitas delas – destaca ainda o El Pais - não se conheciam quando foram presas e nem todas militavam nos mesmos grupos da extrema esquerda que se dividiam entre as que defendiam a luta armada contra os militares - como a nova presidente Rousseff - e as que preferiam lutar contra os militares de outras formas. Na prisão se tornaram todas amigas e agora se reunem como em um sonho: `Nunca imaginei que alguém da luta armada pudesse um dia ser presidente da República´, afirma Rita Sipahi que atuava na Ação Popular, uma advogada que preside hoje a Comissão de Amnistia do Ministério da Justiça” (El Pais, 31.12.2010).
Antes das eleições tive oportunidade de assinalar aqui que Dilma Rousseff tudo fez para que não se aprofundasse seu passado na luta armada; e que, tanto ela quanto o PT, não haviam dado provas de seu abandono efetivo das ideologias e práticas que levaram grupos de esquerda a enveredar pela luta armada. Dilma jamais se arrependeu publicamente de sua participação nesse tipo de ativismo político.
Ao fazer o convite a suas companheiras de luta desvaneceu as dúvidas que pudessem subsistir, pois exaltou o princípio do terrorismo como meio legítimo para alcançar o poder. A Presidente apenas afirma que o País mudou, acentuando desse modo que as circunstâncias são outras e não justificam, por agora, o uso de métodos de luta que incluam as ações terroristas. Mas a questão é estratégica e não de princípios.
Um legado alarmante
Os dois atos simbólicos, de Lula e de Dilma, meticulosamente planejados no tempo, se somam e pretendem ser reveladores do sentido mais íntimo do projeto de poder lulo-petista. O lulo-petismo – ontem com Lula na Presidência, hoje com Dilma – não renunciou à ideologia de esquerda que inspirou a luta armada, nem renunciou às metas e aos métodos da esquerda, inclusive terrorista. Ao proteger e homenagear os protagonistas da luta armada, afirma que esse passado deve ser exaltado (embora, por conveniências, possa não ser seguido).
O lulo-petismo não acredita no sistema de Democracia representativa. Apenas se serve desse regime e de suas liberdades para alcançar o poder e destruir a própria democracia.
Coincidência: esses dois atos simbólicos se dão precisamente quando o terrorismo de esquerda volta a ressurgir na Europa, e mais concretamente na Grécia e na Itália, com os recentes atentados à bomba a diversas embaixadas.
Outra coincidência: esses dois atos se dão quando o regime de Hugo Chávez vem transformando o território venezuelano em refúgio seguro e campo de treinamento de grupos terroristas como as FARC da Colômbia, a ETA da Espanha, o Hezbollah do Líbano (financiado pelo regime iraniano), o IRA da Irlanda, etc. O mesmo Hugo Chávez que não escondeu seu apoio a Dilma Rousseff.
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7 comentários:
Post perfeito! Parabéns! Marcos Serpa Oyhenard
Ótima análise do “fecho de carvão” do governo Lula. Parabéns!
Para o ex-presidente, que não deixou saudades, o bandido italiano Batisti é um herói e merece todas as homenagens. Enquanto que o herói cubano, Zapata, foi comparado por Lula a um bandido, por lutar contra a ditadura fidelcastrista, portanto, um terrorista que merecia apodrecer nas masmorras do “coma-andante”.
Olá, caríssimo escriba.
É inconcebível manter Battisti no Brasil, sob vários pontos de vista. Parece-me que o sr. Lula, no apagar das luzes, pretendia engolfar à todos com sua costumeira egolatria e no-sense, a apostar na demagogia e deliquência intelectual. Pois bem, deu o tiro onde viu e acertou muito mais o que não viu. Quando as luzes acenderam-se no limiar do nono ano do governo PT, com a Sra Dilma, a fantasia, a farsa, o deboche, a afronta. à soberania das leis, veio abaixo.
Cordiais saudações, sr. Sepúlveda.
Simone Serrou
Abrangente e impecável este seu artigo sobre a postura da esquerda brasileira materializada na conduta de Luiz Inácio e sua cria em relação a este criminosos italiano.
Irei recomendar a leitura aos meus amigos.
Gostei do blog. Tem mais um seguidor, o Fusca das charges indóceis.
Veja a charge sobre o PAC cujo pai é Battisti e cuja mãe vocês já sabem... é a Filha da Lulla
Boa noite bonito post , gostei mesmo muito, talvez poderiamos tornar-nos amigos de blog :) lol!
Aparte de piadas chamo-me Sam, e como tu escrevo webpages embora o tema principal do meu espaço é bastante diferente deste....
Eu escrevo páginas de poker sobre poker online sem teres de por o teu cash......
Apreciei imenso o que vi escrito novamente
Voltarei!:)
Ps:tenho um portugues ruim.
Hello é a 1ª vez que vi o teu blog e adorei muito!Bom Projecto!
Até à próxima
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